Morfossintaxe

Vamos pensar a língua?

Papéis temáticos: O que são, quais são e como identificá-los nas sentenças.

30-11-2020Por Adriele da Silva e Leticia Rodrigues da Silva (Alunas Letras Português/Inglês) Orientador: Hélcius Batista Pereira

Sophia está assistindo televisão, até que ouve a seguinte frase da vizinha que chegou para conversar com sua mãe: “Seu Clemente matou o gato de Sophia com um pedaço de pau na rua Santa Catarina”. Ela saiu às pressas querendo saber o que tinha acontecido com o seu gato.

Sophia assimilou uma série de informações que foram transmitidas pela vizinha por meio dessa frase. Primeiro, que seu gato estava morto. Segundo, que alguém tinha matado seu gato, Seu Clemente. Terceiro, que seu gato tinha sido morto com um pedaço de pau. E por fim, que isso tinha acontecido na rua Santa Catarina.

A partir disso, podemos identificar os papéis temáticos. Os papéis temáticos são traços semânticos que um predicador atribui a seu escopo, ou seja, são significados que são dados a um termo ou expressão. Assim, pode-se destacar quatro papéis temáticos: agente, paciente, instrumento e lugar.

O agente é aquele que realiza a ação. Na frase que a vizinha proferiu o agente é o “Seu Clemente”, ele é quem realiza a ação de matar. Já o paciente é aquele que está num determinado estado ou que sofre mudança de estado. Assim, “o gato de Sophia” é o paciente, não porque ele tinha paciência ou porque estava doente, mas porque ele estava num estado, vivo, e sofreu uma mudança de estado, de vivo para morto.

Quanto ao instrumento, ele é algo que se usa na ação, é o objeto que desempenha um papel no desencadeamento de um processo, não sendo, porém, a força motivadora, a causa ou o instigador. No caso, “um pedaço de pau” é o instrumento; foi com ele que Seu Clemente matou o gato. Então ele foi usado na ação, desempenhando um importante papel para o desencadeamento do processo, uma vez que Seu Clemente precisou dele para conseguir matar o gato. Mas não foi por causa dele que Seu Clemente matou o gato, provavelmente foi porque ele não gostava de gatos, ou porque o gato fez algo que ele não gostou, ou apenas porque ele era uma pessoa muito maldosa. Talvez a vizinha possa esclarecer.

Voltando aos papéis temáticos, o lugar é a relação do verbo com uma expressão locativa, ou seja, referente ao local em que determinada ação aconteceu. Assim, na frase em questão, a expressão “rua Santa Catarina” possui o papel temático lugar.

Logo, percebe-se que o verbo da frase, “matar”, estabelece uma relação com “Seu Clemente”, com “o gato de Sophia”, com “um pedaço de pau” e com “rua Santa Catarina”. Assim, tem-se: quem matou, quem morreu, como/com o que morreu e onde morreu, respectivamente. Esses são, pois, os argumentos que o verbo em questão pode abarcar. Ademais, vale destacar que todos esses “argumentos” são, na verdade, os escopos do verbo (que é o predicador).

Além dos papéis temáticos mencionados, pode-se destacar mais dois deles: o experienciador e o beneficiário. O experienciador é aquele que está mentalmente disposto a receber uma experiência, percepção etc. Mas não é o instigador da ação. Por exemplo, na frase “O gato de Sophia morreu”, “o gato” é o experienciador, uma vez que experiencia estar morto, não há uma ação propriamente dita envolvida, o mesmo ocorre com o verbo “pensar”.

Já o beneficiário é aquele que se beneficia da ação. Por exemplo, na frase “Sophia enviou uma carta para Seu Clemente”, “Seu Clemente” é o beneficiário, uma vez que ele se beneficia da ação realizada por Sophia, ele irá receber a carta.

Viu só? Podemos nos valer de qualquer frase do português e analisá-la, não precisamos apenas decorar um monte de regras. É só pensarmos a língua!