Editorial

Editorial da Esperança

Pela perpetuação do pensamento crítico e da Ciência Brasil afora.

01-11-2022Por: Érica Fernandes Alves, Fabrício César de Aguiar, Geniane Diamante F. Ferreira e Hélcius Batista PereiraDocentes do Curso de Letras/UEM e Coordenadores do Mastigando Letras

O Mastigando Letras acordou no dia 31 de outubro de 2022 cheio de esperança. Sim, ficamos alegres com o resultado das eleições para presidente do Brasil e nos enchemos de expectativa por novos tempos. Não por uma opção partidária, ainda que sejamos feitos de gente que tem todo o direito de escolher partidos e propostas. Ficamos, isto sim, esperançosos porque o presidente derrotado sempre apresentou uma postura anticiência e antieducação.

O governo que se encerra em 2022 abriu seu mandato lançando suspeitas sobre o trabalho de professores em sala de aula, tentando favorecer a chamada “Escola sem partido”. Na visão que propalava, professores e professoras eram acusados de doutrinação. Isso porque a Educação é porta para o pensamento crítico e esta é arma contra a dominação que se pretendia levar a cabo.

Na sequência, promoveu profundos cortes de bolsas de pesquisa e de recursos da Educação, passando a enquadrar as universidades brasileiras como sendo promotoras de “balbúrdia”. Desprezando a importância da escola, o governo que se encerra sempre primou por escolher péssimos nomes para gerir o MEC, gente despreparada que nunca viveu a realidade do ensino e que usou o ministério para instrumentalizar uma espécie de guerra ideológica contra um inimigo invisível. Relegou ainda a Ciência & Tecnologia a um astronauta que provavelmente perdeu-se pelo universo, desprendido da nave mãe da Terra.

A postura anticientífica da gestão Bolsonaro ficou ainda evidente na sua política ambiental. Alimentando a fome da parcela irresponsável do agronegócio que ignora os riscos impostos à vida na Terra e aposta em um comércio exterior despreocupado com questões ambientais, o governo atual tentou desacreditar as instituições de pesquisa que alertavam para o aprofundamento do desmatamento. Também desmantelou e subverteu as instituições que protegiam a população indígena brasileira, aprofundando a política de genocídio promovida pela busca selvagem por lucros.

Tudo parecia apenas uma guerra cultural ou a atuação contra grupos minoritários da sociedade brasileira, que pouco afetava o cidadão comum. Era apenas um governo ultraconservador travando batalhas contra as universidades, os defensores dos direitos humanos, os ambientalistas, sempre acusados de serem “esquerdistas”. Então, em 2020, veio a pandemia de COVID-19. E a postura anticiência tornou-se um caso grave. O governo se recusou a ouvir cientistas, apostando em estimular a população a se expor ao vírus, a automedicar-se com “tratamentos precoces” não comprovados pela Ciência e, por fim, recusou-se e atrasou-se na compra de vacinas, levando o Brasil para uma tragédia sem precedentes, ceifando a vida de quase 700 mil brasileiros.

Mas não ficou nisso. A gestão bolsonarista foi marcada por denúncias de corrupção no MEC. Refém de “falsos” religiosos que compatibilizam Deus e dinheiro, o Ministério, pelo que se denunciou na imprensa, foi transformado em balcão de negócios. Não bastava a redução de recursos; era preciso usar o orçamento restante da educação básica para interesses políticos e privados.

Por fim, bem recentemente, para sustentar o chamado orçamento secreto, como o próprio nome diz, marcado pela falta de transparência, o governo ainda tentou reduzir os recursos das universidades federais a níveis que inviabilizariam o seu funcionamento.

Não, não é preciso ser de esquerda para avaliar o (des)governo que se encerrará em 2022 como um desastre para a Educação e para a Ciência brasileira. Não é por acaso que muitas instituições, como a renomada revista científica Nature – que nunca poderá ser acusada de ser “comunista” - posicionou-se antes das eleições presidenciais brasileiras contra a reeleição do atual presidente da República. Não se trata de uma escolha partidária, mas de uma opção que pretende proteger a Educação, a Ciência, a vida dos brasileiros e do planeta Terra.

A Terra é sim redonda; o aquecimento global é sim uma realidade; o regime político brasileiro de 1964 a 1985 foi sim uma ditadura autoritária de direita; o nazismo alemão pertencia sim à corrente ideológica da ultradireita; vacinas salvam sim vidas; a presença de crianças com deficiências na escola regular não prejudica, mas enriquece sim o aprendizado de todos nas escolas; estudar Filosofia, Ciências Sociais, História, Arte, Literatura é sim fundamental para a formação de qualquer profissional brasileiro, mesmo os mais técnicos; falar de racismo, gênero e direitos humanos na escola não é ação de doutrinação esquerdista, sendo sim conteúdos necessários para a formação de todo ser humano; a população pobre deve sim ter acesso à universidade; Paulo Freire deixou sim um legado imenso para a Ciência e para a Educação mundial ao alertar para a importância do pensamento crítico e livre e ao defender que o ensino-aprendizado não se faz por depósito de conhecimentos prontos e acabados na cabeça vazia dos aprendizes; encher o currículo Lattes de cursos não realizados não capacita ninguém a ser Ministro da Educação e deve sim ser considerada uma ação antiética e criminosa.

Que o novo governo reconstrua o que foi destruído e atue para que o pensamento crítico e a perspectiva científica se perpetuem Brasil afora.